sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

VIOLÊNCIA URBANA

Uma abordagem epidérmica do problema
Em nosso país, quem nunca foi vítima de um ato de violência urbana que atire a primeira pedra! Atire, com violência inclusive. O sujeito, hoje em dia, não consegue andar pelas ruas de uma cidade...  sem ser molestado. Por qualquer (ou nenhum) motivo pode se ver no centro de uma agressão física - uma dolorosa experiência que vai do chega-pra-lá ao nocaute-pra-sempre.
Significando este último: ser mandado para a cidade-dos-pés-juntos. Uma cidade tão superlotada que, se todos, ao mesmo tempo, espreguiçassem as pernas, a situação ficaria de morte. E de morte para todos, sem distinção de raça, sexo, credo ou seguro-funerário.
Tome cinco, Paulinho Rangel! Você estava mesmo com o santo nos couros ao escrever que, na "República do 1º de Abril", se vive sob o império de quatro leis:
1ª - Lei do Mais Forte
2ª - Lei da Selva
3ª - Lei do Cão
4ª - Lei do Murici ( que cada um cuide de si).
Se a "República" de Platão foi utópica; a de Rangel, não. Existe verdadeiramente e, por ter como cenário uma nação perita em futebol, vive chutando por aí. Porém, não vou me deter nas raízes do problema da violência urbana, outros que ralem a mandioca. O assunto é por demais complexo, mistura-se com política, e de política somente me interessa a do corpo: como mantê-lo vivo?
Sim, como mantê-lo vivo? Uma ajuda, respondo, é o conhecimento do que acontece no corpo, no plano da fisiologia, ao ser mobilizado para uma ação de agressão e defesa. O conhecimento puro é importante e, mais ainda, é a sua aplicabilidade no dia-a-dia-de-cão.
Em preparação para uma luta, o ser humano experimenta várias alterações fisiológicas, mediadas pelo sistema nervoso autônomo. Este sistema, por sua vez, é composto de dois subsistemas que se contrabalançam: o simpático e o parassimpático.
É o simpático que faz os preparativos internos para a luta. Acionado, contrai os vasos da pele e das vísceras para que mais sangue aflua ao cérebro (favorecendo o raciocínio rápido) e aos músculos (ensejando o aumento da força), aumenta o açúcar sanguíneo (garantindo o dispêndio extra de energia), acelera a respiração e os batimentos cardíacos, apressa a coagulabilidade sanguínea (reduzindo as perdas prováveis de sangue) etc. Dentre as transformações fisiológicas descritas, apenas uma pode ser percebida de relance (em tempo hábil, portanto). Trata-se da contração dos vasos cutâneos, cuja tradução clínica desse fenômeno é o empalidecimento brusco da pele. Num entrevero de rua, procure observar se isto acontece, ou não, no rosto de seu oponente.
Recém-empalidecido significa influência do simpático, fisiologia a serviço do embate-bate, agressão possível ou iminente: você se prepara. Ao contrário, recém-ruborizado significa influência do parassimpático, despreparo para a luta, agressão não cogitada: você relaxa.
Agora, se você está a caminhar pela Rua do Rosário e, sem querer, pisa na unha encravada de um estranho que reage assim: nem empalidece nem enrubesce, mas fica verde, furioso e de camisa rasgada, aí maninho, neste caso, a esperança de que você salve a própria pele está nas coisas práticas da vida. Fugir, gritar mamãe, contar com as pernas, pedir o urinol, safar-se, escafeder-se, apegar com o santo, dar às de vila-diogo e, se possivel, tudo ao mesmo tempo.
(1982)

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