terça-feira, 2 de dezembro de 2008

ZÉ BRASIL (ESQUETE)

O pano é aberto.
Mostra um cenário "hollywoodiano" - apenas no calendário da parede (merchandising da Souza Cruz). É o interior de um humilde barracão, pois.
Há a movimentação de dois personagens. Um, que atende pelo nome de Zé Brasil (em verdade, este pouco se movimenta; limita-se a dar gemidos pungentes numa cama), e outro, que representa a sua esposa, D. Esperança.
Alguém sopra dos bastidores:

Começa, ô panaca!
ZÉ BRASIL
Ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai, oi.
(Esta última interjeição não foi um gemido e sim uma saudação que ele endereçou a um terceiro personagem que penetrou no recinto.)
O novo figurante faz o médico. É um tipo gorducho, de óculos, que lembra o Dr. Sardinha da televisão, que lembra o... Bom, deixa pra lá.
(Na sua direção, aflita, corre D. Esperança.)
D. ESPERANÇA
Dr. Golfinho, meu esposo agoniza.
DR. GOLFINHO (pegando o pulso do paciente)
Calmaí... Quando começou a doença dele?
D. ESPERANÇA
Tem andado doente há alguns anos. Nos últimos tempos, esteve sob os cuidados de Dr. Henrique Simão que o proibiu de beber. Mas, ontem, após receber o seu mês de INPS, gastou o dinheiro todo na cachaça.
DR. GOLFINHO
Hum... deixe-me ver... Deve ter bebido meio litro de aguardente.
D. ESPERANÇA
Por aí, doutor. Então, quando acordou da bebedeira, elezinho falou de uma dor no umbigo e se pôs a gemer.
Dr. Golfinho passa a examinar o abdome do enfermo. Nesse ínterim, o contra-regra entra no palco para retirar um samovar - utensílio russo que não se coaduna com a ambientação da peça. E, concluída a apalpação diagnóstica, abre a sua maleta para pegar um frasco de remédio. O que faz com um sorriso de satisfação: sorriso gordo, com os dois queixos de gordo.
DR. GOLFINHO (mostrando "eucaristicamente" o frasquinho)
Pronto, minha senhora.
D. ESPERANÇA (esperançosa)
O remédio age logo?
DR. GOLFINHO
Antes de lhe dar a resposta, me dê uma informação. Vocês têm filhos?
D. ESPERANÇA
Netos também, doutor.
DR. GOLFINHO
Ótimo! E agora lhe respondo... que o medicamento tem ação imediata. Mas, antes de ministrá-lo, a senhora tem que agitar o frasco por uns quarenta anos. Comece agora. Vai servir para o Zé Brasil Neto.
Vendo o público enfurecido, Dr. Golfinho retira-se apressadamente. Nada tem de heróico o mezinheiro.
Cai, por enquanto, o pano.

(escrito em 1980, revisado em 2008)

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